sábado, 22 de setembro de 2018

Gestação


Flor ou outra.
Na condensação do açúcar,
intumesce a primavera.
Folículos e brotos
se adensam.
Lateja, no barro, a semente
e o verbo no coração.

Pulsações.

Entre pólen e favo
a abelha trama um enredo.
Entre flor e fruto
o homem urde a história.

Cumpre-se, mágico, o tempo.

Elizabeth Gontijo
In de um segredo 

Primavera




Ah! quem nos dera que isto, como outrora,
Inda nos comovesse! Ah! quem nos dera
Que inda juntos pudéssemos agora
Ver o desabrochar da primavera!


Saíamos com os pássaros e a aurora.
E, no chão, sobre os troncos cheios de hera,
Sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
“Beijemo-nos! amemo-nos! espera!”

E esse corpo de rosa recendia,
E aos meus beijos de fogo palpitava,
Alquebrado de amor e de cansaço.

A alma da terra gorjeava e ria…
Nascia a primavera… E eu te levava,
Primavera de carne, pelo braço!

Olavo Bilac
arte desconheço autoria

Primavera-Menina


O ar encheu-se de festa.
Há poemas no ar
valsando ao luar.
É a primavera-menina
correndo aos ventos.
Vida frutificando
de mil formas...
Encantando
na esperança
de ser mulher,
sem esquecer a criança
dos dias claros e festivos
que é...

Alvina Tzovenos
de Sonhos e Vivências poesias

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Ao dia sete de setembro





Mancebos, que sois a esperança
Do majestoso Brasil;
Mancebos, que inda tão tenros
Sabeis de louro gentil
Adornar o pátrio dia,
Nosso dia senhoril!

Eis que assomou sobre os montes
Além, sobre a antiga serra,
Entre mil nuvens de rosa,
O dia de nossa terra;
Aquele que para a Pátria
Milhões de glórias encerra.

Foi hoje que o Lusitano,
Que o filho de além do mar,
Despertou com forte brado
A Pátria que era a sonhar,
Que nem sequer escutava
A liberdade a expirar.

E o brado: — "Livres ou mortos"
Lá nos bosques retumbou;
E mais contente o Ipiranga
As suas águas rolou;
E o eco d'alta montanha
Todo o Brasil ecoou.

E as montanhas lá do Sul,
E as montanhas lá do Norte,
Repetiram em seus cumes:
Sempre ser livres ou morte...
E lá na luta renhida
Cada qual luta mais forte.

Sim, nos combates que, ousados,
Travaram cem contra mil,
O mancebo que nascera
Sob este azul céu de anil,
Forte como um Bonaparte,
Batia o forte fuzil.

E cada qual no combate
Ao ribombar do canhão
Queria à custa da vida
Dar à Pátria salvação,
Vingar a terra natal
D'aviltante servidão.

Eia, pois, flores da Pátria,
Esp'rançosa mocidade!
Que os Andradas e os Machados
Do alto da Eternidade
Contentes vos abençoam
No dia da Liberdade.

Castro Alves
arte  François-René Moreaux


Método Infalível




Aproxime-se mais.
Tente sentir do que um abraço é capaz.
Quando bem apertado,
ele ampara tristezas,
sustenta lágrimas,
combate incertezas,
põe a nostalgia de lado.
É até capaz de amenizar o medo.
Se for cheio de ternura,
ele guarda segredos
e jura cumplicidade.
Um abraço amigo de verdade
divide alegrias
e se apraz em comemorações.
Abraços são pequenas orações
de fé, de força e energia.
Olhe para o lado:
há alguém que quer ser abraçado
e não tem coragem de dizer.
Enlace-o.
O pior que pode acontecer
É ganhar de volta um sorriso de carinho
ou, quem sabe, uma palavra sincera.
Voce vai descobrir que ninguém está sozinho
e que a vida pode ser um eterno céu de Primavera.

Flora Figueiredo


Tratado Manso de Loucura



Como amo a paz de estar comigo!
Essa fusão de alma-umbigo,
esse roteiro quente do meu sangue.
Eu que conheço cada palmo dos meus passos,
que me retenho e me disponho.
Faço dos versos meu avesso,
dos adversos, meu passado,
das alegrias, meu recomeço.
Deito liquefeita e, de repente,
amanheço solidificada.
Sou água, sou pedra,
às vezes nuvem,
às vezes nada.
Por ser inconstante e difusa,
enrolo e desenrolo essa vida
num movimento mágico e confuso,
admito ser ou não ser
e ser assim.
Como é bom sentir-me tão querida,
tão bem-amada e tão dividida,
eu resolvida inteiramente por mim!

Flora Figueiredo
In Florescência