quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Dor Eterna




O tempo – dizem – apaga
O prazer e o sofrimento
Sobre eles rolando a vaga
Sombria do esquecimento.

E transforma encantadores
Sítios, que tu, Abril, vestes
De uma gaze de esplendores,
Em sítios feios e agrestes.

E faz germinar nas águas,
Que bebe a gandra bravia,
O lírio, como das mágoas
Brota a flor da alegria.

E, no entretanto, contemplo,
Extática e dolorosa,
Entre os escombros de um templo
Desmoronado, caída

A ara ebúrnea, de que há tanto
Despenhou-se a idolatrada
Imagem, que vejo, em pranto,
De lodo vil salpicada...

Por isso, pungida à aguda
Pena, que o olvido não calma,
Diz à revolta, sanhuda
Onda do tempo a minha alma:

“– Rola túmida ou desfeita.
Que importa? – Como os granitos,
Conservo, pedaços feita,
Os caracteres inscritos.”

Júlia Cortines 

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